domingo, 31 de maio de 2009

Acalanto

"Põe a mão na minha mão, pode fechar meus olhos, alisa os meus cabelos e a quem perguntar, "Deus, que foi que aconteceu?" vou jurar que o teu sangue é meu. Eu vou rasgar meu coração pra costurar o teu"

Chico Buarque

Pedaço de mim...




Oh, pedaço de mim
Oh, metade afastada de mim
Leva o teu olhar
Que a saudade é o pior tormento
É pior do que o esquecimento
É pior do que se entrevar

Oh, pedaço de mim
Oh, metade exilada de mim
Leva os teus sinais
Que a saudade dói como um barco
Que aos poucos descreve um arco
E evita atracar no cais

Oh, pedaço de mim
Oh, metade arrancada de mimLeva o vulto teu
Que a saudade é o revés de um parto
A saudade é arrumar o quarto
Do filho que já morreu

Oh, pedaço de mim
Oh, metade amputada de mim
Leva o que há de ti
Que a saudade dói latejada
É assim como uma fisgada
No membro que já perdi

Oh, pedaço de mim
Oh, metade adorada de mim
Lava os olhos meus
Que a saudade é o pior castigo
E eu não quero levar comigo
A mortalha do amor
Adeus

Chico Buarque

sexta-feira, 29 de maio de 2009

Poema das Horas

"...Não sei sentir, não sei ser humano,
não sei conviver de dentro da alma triste,
com os homens, meus irmãos na terra.
Não sei ser útil, mesmo sentindo ser prático, cotidiano, nítido.
Vi todas as coisas e maravilhei-me de tudo.
Mas tudo ou sobrou ou foi pouco,
não sei qual, e eu sofri.
Eu vivi todas as emoções, todos os pensamentos, todos os gestos.
E fiquei triste como se tivesse
querido vivê-los e não conseguisse.
Amei e odiei como toda gente.
Mas para toda gente isso foi normal e instintivo.
Para mim sempre foi a exceção, o choque, a válvula, o espasmo.
Não sei se a vida é pouco ou demais para mim.
Não sei se sinto demais ou de menos.
Seja como for, a vida, de tão interessante que é a todos os momentos,
a vida chega a doer, a enjoar, a cortar, a roçar, a ranger,
a dar vontade de dar pulos, de ficar no chão,
de sair para fora de todas as casas,
de todas as lógicas, de todas as sacadas
e ir ser selvagem entre árvores e esquecimentos..."

Poema das Horas
Álvaro de Campos

sexta-feira, 22 de maio de 2009

Poema Sujo

Eu não sabia, tu não sabias fazer girar a vida com seu montão de estrelas de oceano entrando-nos em ti! Bela, bela, mais que bela! Mas como era o nome dela? Não era Helena, nem Vera , nem Nara, nem Gabriela, nem Tereza, nem Maria... seu nome, seu nome era... Perdeu-se na carne fria, perdeu na confusão de tanta noite e tanto dia, perdeu-se na profusão das coisas acontecidas, mudou de cara e cabelos, mudou de olhos e risos, mudou de casa e de tempo, mas está comigo, está perdido comigo teu nome"

Ferreira Gullar



quinta-feira, 21 de maio de 2009

Um amor puro...

O que há dentro do meu coração
Eu tenho guardado pra te dar
E todas as horas que o tempo
Tem pra me conceder
São tuas até morrer
E a tua história, eu não sei
Mas me diga só o que for bom
Um amor tão puro que ainda nem sabe
A força que tem, é teu e de mais ninguém
Te adoro em tudo, tudo, tudo
Quero mais que tudo, tudo, tudo
Te amar sem limites
Viver uma grande história
Aqui ou noutro lugar
Que pode ser feio ou bonito
Se nós estivermos juntos
Haverá um céu azul
Um amor puro
Não sabe a força que tem
Meu amor eu juro
Ser teu e de mais ninguém

terça-feira, 19 de maio de 2009

Metade


Que a força do medo que tenho
Não me impeça de ver a verdade.
Que a morte de tudo em que acredito
Não me tape os ouvidos e a boca
Porque metade de mim é o que eu grito
Mas a outra metade é o silêncio.
Que a música que ouço ao longe
Seja linda ainda que triste
Que as pessoas que eu amo seja pra sempre amada
Mesmo que distante
Porque metade de mim é partida
Mas a outra metade é saudade.
Que as palavras que eu falo
Não sejam ouvidas como prece e nem repetidas com fervor
Apenas respeitadas
Como a única coisa que resta a uma pessoa inundado de sentimentos
Porque metade de mim é o que ouço
Mas a outra metade é o que calo.
Que essa minha vontade de ir embora
Se transforme na calma e na paz que eu mereço
Que essa tensão que me corrói por dentro
Seja um dia recompensada
Porque metade de mim é o que eu penso e a outra metade é o que sinto.
Que o medo da solidão se afaste, que o convívio comigo mesmo se torne ao menos suportável.
Que o espelho reflita em meu rosto um doce sorriso
Que eu me lembro ter dado na infância
Porque metade de mim é a lembrança do que fui
Mas a outra metade eu não sei.
Que não seja preciso mais do que uma simples alegria
Pra me fazer aquietar o espírito
E que o teu silêncio me fale cada vez mais
Porque metade de mim é abrigo
Mas a outra metade é cansaço.
Que a força do medo que tenho
Não me impeça de ver a verdade.
Que a morte de tudo em que acredito
Não me tape os ouvidos e a boca
Porque metade de mim é o que eu grito
Mas a outra metade é o silêncio.
Que a música que ouço ao longe
Seja linda ainda que triste
Que as pessoas que eu amo seja pra sempre amada
Mesmo que distante
Porque metade de mim é partida
Mas a outra metade é saudade.
Que as palavras que eu falo
Não sejam ouvidas como prece e nem repetidas com fervor
Apenas respeitadas
Como a única coisa que resta a uma pessoa inundado de sentimentos
Porque metade de mim é o que ouço
Mas a outra metade é o que calo.
Que a força do medo que tenho
Não me impeça de ver a verdade.
Que a morte de tudo em que acredito
Não me tape os ouvidos e a boca
Porque metade de mim é o que eu grito
Mas a outra metade é o silêncio.
Que a música que ouço ao longe
Seja linda ainda que triste
Que as pessoas que eu amo seja pra sempre amada
Mesmo que distante
Porque metade de mim é partida
Mas a outra metade é saudade.
Que as palavras que eu falo
Não sejam ouvidas como prece e nem repetidas com fervor
Apenas respeitadas
Como a única coisa que resta a uma pessoa inundado de sentimentos
Porque metade de mim é o que ouço
Mas a outra metade é o que calo.
Que essa minha vontade de ir embora
Se transforme na calma e na paz que eu mereço
Que essa tensão que me corrói por dentro
Seja um dia recompensada
Porque metade de mim é o que eu penso e a outra metade é o que sinto.
Que o medo da solidão se afaste, que o convívio comigo mesmo se torne ao menos suportável.
Que o espelho reflita em meu rosto um doce sorriso
Que eu me lembro ter dado na infância
Por que metade de mim é a lembrança do que fui
Mas a outra metade eu não sei.
Que não seja preciso mais do que uma simples alegria
Pra me fazer aquietar o espírito
E que o teu silêncio me fale cada vez mais
Porque metade de mim é abrigo
Mas a outra metade é cansaço.
Que a arte da vida nos aponte uma resposta
Mesmo que ela não saiba
E que ninguém a tente complicar
Porque é preciso simplicidade pra fazê-la florescer
Porque metade de mim é a platéia
A outra metade é a canção.
E que a minha loucura seja perdoada
Porque metade de mim é amor
E a outra metade também.
Que essa minha vontade de ir embora
Se transforme na calma e na paz que eu mereço
Que essa tensão que me corrói por dentro
Seja um dia recompensada
Porque metade de mim é o que eu penso e a outra metade é o que sinto.
Que o medo da solidão se afaste, que o convívio comigo mesmo se torne ao menos suportável.
Que o espelho reflita em meu rosto um doce sorriso
Que eu me lembro ter dado na infância
Porque metade de mim é a lembrança do que fui
Mas a outra metade eu não sei.
Que não seja preciso mais do que uma simples alegria
Pra me fazer aquietar o espírito
E que o teu silêncio me fale cada vez mais
Porque metade de mim é abrigo
Mas a outra metade é cansaço.
Que a arte da vida nos aponte uma resposta
Mesmo que ela não saiba
E que ninguém a tente complicar
Porque é preciso simplicidade pra fazê-la florescer
Porque metade de mim é a platéia
A outra metade é a canção.
E que a minha loucura seja perdoada
Porque metade de mim é amor
E a outra metade também.
Que a arte da vida nos aponte uma resposta
Mesmo que ela não saiba
E que ninguém a tente complicar
Porque é preciso simplicidade pra fazê-la florescer
Porque metade de mim é a platéia
A outra metade é a canção.
E que a minha loucura seja perdoada
Porque metade de mim é amor
E a outra metade também.
Oswaldo Montenegro

sábado, 16 de maio de 2009

David

Dio ha creato l'uomo a sua immagine e somiglianza, ma dopo Michelangelo decise di farsene una propria, molto migliore i ha chiamato la creazione di David.

Saudades de mim...


"Há um grande cansaço na alma do meu coração. Entristece-me quem eu nunca fui, e não sei que espécie de saudades é a lembrança que tenho dele."
Clarice Lispector

Não muito distante.

Eu queria mais alegria,
Isso é que eu queria,
Alegria a correr todo o ano
Era só isso que eu queria, mais alegria,
Mas não foi, não foi bem, o meu caso...
É que eu também já sabia,
Eu já sabia,
Já sabia qual era o engano
É que eu não tive o que eu queria, quando podia,
E depois, mais alguém, nunca mais
Disse-me um dia, não muito distante
Volta num dia, não muito distante
Quem sentiu o que eu sentia, quando partia,
E partia levando o encanto
Fica a saber que eu choro, por tanta alegria
Como eu sei, sei tão bem, e não tive
Disse-me um dia, não muito distante
Volta num dia, não muito distante
E eu disse um dia, não muito distante
Disse-lhe um dia, não muito distante.

Madredeus

Ao longe o mar...


Porto calmo de abrigo
De um futuro maior
Ainda não está perdido
No presente temor
Não faz muito sentido
Já não esperar o melhor
Vem da névoa saindo
A promessa anterior
Quando avistei
Ao longe o mar
Ali fiquei
Parado a olhar
Sim, eu canto a vontade
Canto o teu despertar
E abraçando a saudade
Canto o tempo a passar
Quando avistei
Ao longe o mar
Ali fiquei
Parada a olhar
Quando avistei
Ao longe o mar
Sem querer deixei-me
Ali ficar

Madredeus

sexta-feira, 15 de maio de 2009

Quels yeux tes yeux...


Ô bien-aimée, quels yeux tes yeux
Embarcadères la nuit, bruissant de mille adieux
Des digues silencieuses
Qui guettent les lumières
Loin… si loin dans le noir
Ô bien-aimée, quels yeux… tes yeux
Tous ces mystères dans tes yeux
Tous ces navires, tous ces voiliers
Tous ces naufrages dans tes yeux
Ô ma bien-aimée aux yeux païens
Un jour, si Dieu voulait
Un jour… dans tes yeuxJe verrais de la poésie, le regard implorant
Ô ma bien-aimée, quels yeux… tes yeux

Poema dos olhos da amada



Ó minha amada
Que olhos os teus
São cais noturnos
Cheios de adeus
São docas mansas
Trilhando luzes
Que brilham longe
Longe dos breus...
Ó minha amada
Que olhos os teus
Quanto mistério
Nos olhos teus
Quantos saveiros
Quantos navios
Quantos naufrágios
Nos olhos teus...
Ó minha amada
De olhos ateus
Quem dera um dia
Quisesse Deus
Eu visse um dia
O olhar mendigo
Da poesia
Nos olhos teus...

Vinícius de Moraes

Soneto da separação


"De repente do riso fez-se o pranto
Silencioso e branco como a bruma
E das bocas unidas fez-se a espuma
E das mãos espalmadas fez-se o espanto
De repente da calma fez-se o vento
Que dos olhos desfez a última chama
E da paixão fez-se o pressentimento
E do momento imóvel fez-se o drama
De repente não mais que de repente
Fez-se de triste o que se fez amante
E de sozinho o que se fez contente
Fez-se do amigo próximo, distante
Fez-se da vida uma aventura errante
De repente, não mais que de repente."

Vinícius de Moraes / Antonio Carlos Jobim

Si tu no estás aqui...


Si Tu No Estas Aqui
No quiero estar sin ti
Si tu no estas aqui me sobra el aire
No quiero estar asi
Si tu no estas la gente se hace nadie.
Si tu no estas aqui no se
Que diablos hago amandote
Si tu no estas aqui sabras
Que Dios no va a entender por que te vas.
No quiero estar sin ti
Si tu no estas aqui me falta el sueño
No quiero andar asi
Latiendo un corazon de amor sin dueño.
Si tu no estas aqui no se...
Derramare mis sueños si algun dia no te tengo
Lo mas grande se hara lo mas pequeño
Paseare en un cielo sin estrellas esta vez
Tratando de entender quien hizo
Un infierno el paraiso
No te vayas nunca porque
No puedo estar sin ti
Si tu no estas aqui me quema el aire.
Si tu no estas aqui no se...
Si tu no estas aqui.

Te voglio bene, assaie...


"...Ma due occhi che ti guardano cosí vicini e veri
Ti fan scordare le parole confondono i pensieri
Cosí diventa tutto piccolo
Te voglio bene assaie ma tanto bene sai
É una catena ormai che scioglie il sangue dint'e vene sai..."

Caruso

Poema do Menino Jesus


Não sou religioso nem sei em que realmente acredito. Mas esse poema de Fernado Pessoa ganhou na interpretação de Maria Bethânia um toque muito mais que especial e me comove, ainda não sei por que, sempre que o ouço. Portanto, aí vai:


"Num meio-dia de fim de primavera eu tive um sonho como uma fotografia: eu vi Jesus Cristo descer à Terra. Ele veio pela encosta de um monte, mas era outra vez menino, a correr e a rolar-se pela erva, a arrancar flores para deitar fora, e a rir de modo a ouvir-se de longe. Ele tinha fugido do céu. Era nosso demais pra fingir-se de Segunda pessoa da Trindade. Um dia que DEUS estava dormindo e o Espírito Santo andava a voar, Ele foi até a caixa dos milagres e roubou três. Com o primeiro Ele fez com que ninguém soubesse que Ele tinha fugido; com o segundo Ele se criou eternamente humano e menino; e com o terceiro Ele criou um Cristo eternamente na cruz e deixou-o pregado na cruz que há no céu e serve de modelo às outras. Depois Ele fugiu para o Sol e desceu pelo primeiro raio que apanhou. Hoje Ele vive na minha aldeia, comigo.

É uma criança bonita, de riso natural. Limpa o nariz com o braço direito, chapinha nas poças d'água, colhe as flores, gosta delas, esquece. Atira pedras aos burros, colhe as frutas nos pomares,e foge a chorar e a gritar dos cães. Só porque sabe que elas não gostam, e toda gente acha graça, Ele corre atrás das raparigas que levam as bilhas na cabeça e levanta-lhes a saia. A mim, Ele me ensinou tudo. Ele me ensinou a olhar para as coisas. Ele me aponta todas as cores que há nas flores e me mostra como as pedras são engraçadas quando a gente as tem na mão e olha devagar para elas. Damo-nos tão bem um com o outro na companhia de tudo que nunca pensamos um no outro. Vivemos juntos os dois com um acordo íntimo, como a mão direita e a esquerda.

Ao anoitecer nós brincamos as cinco pedrinhas no degrau da porta de casa. Graves, como convém a um DEUS e a um poeta. Como se cada pedra fosse todo o Universo e fosse por isso um perigo muito grande deixá-la cair no chão. Depois eu lhe conto histórias das coisas só dos homens e Ele sorri, porque tudo é incrível. Ele ri dos reis e dos que não são reis e tem pena de ouvir falar das guerras e dos comércios. Depois Ele adormece e eu o levo no colo para dentro da minha casa, deito-o na minha cama, despindo-o lentamente, como seguindo um ritual todo humano e todo materno até Ele estar nu.

Ele dorme dentro da minha alma. Às vezes Ele acorda de noite, brinca com meus sonhos. Vira uns de pena pro ar, põe uns por cima dos outros, e bate palmas, sozinho,sorrindo para os meus sonhos.

Quando eu morrer, Filhinho, seja eu a criança, o mais pequeno, pega-me Tu ao colo, leva-me para dentro a Tua casa. Deita-me na tua cama. Despe o meu ser, cansado e humano. Conta-me histórias caso eu acorde para eu tornar a adormecer, e dá-me sonhos Teus para eu brincar."


quarta-feira, 13 de maio de 2009

Orfeu


"Mulher mais adorada!
Agora que não estás, deixa que rompa o meu peito em soluços!
Te enrustiste em minha vida; e cada hora que passa é mais por que te amar, a hora derrama
O seu óleo de amor, em mim, amada...
E sabes de uma coisa? Cada vez que o sofrimento vem, essa saudade de estar perto, se longe, ou estar mais perto, se perto...Ah! que é que eu sei...
Essa agonia de viver fraco, o peito extravasado, o mel correndo; essa incapacidade de me sentir mais eu, tudo isso que é bem capaz de confundir o espírito de um homem... Ah! nada disso tem importância quando tu chegas com essa charla antiga, esse contentamento, essa harmonia, esse corpo! E me dizes essas coisas que me dão essa força, essa coragem, esse orgulho de rei. Ah, minha Eurídice, meu verso, meu silêncio, minha música!
Nunca fujas de mim! Sem ti sou nada, sou coisa sem razão, jogada, sou pedra rolada.
Orfeu menos Eurídice: coisa incompreensível! A existência sem ti é como olhar para um relógio só com o ponteiro dos minutos. Tu és a hora, és o que dá sentido e direção ao tempo, minha amiga mais querida!
Qual mãe, qual pai, qual nada! A beleza da vida és tu, amada, milhões amada!
Ah! Criatura! Quem poderia pensar que Orfeu: Orfeu, cujo violão é a vida da cidade e cuja fala, como o vento à flor despetala as mulheres - que ele, Orfeu, ficasse assim rendido aos teus encantos! Mulata, pele escura, dente branco...
Vai teu caminho que eu vou te seguindo no pensamento e aqui me deixo rente quando voltares, pela lua cheia para os braços sem fim do teu amigo!
Vai tua vida, pássaro contente, vai tua vida que estarei contigo!"
Vinícius de Moraes

terça-feira, 12 de maio de 2009

Depois de ter você


"Depois de ter você, pra que querer saber que horas são? Se é noite ou faz calor, se estamos no verão, se o sol virá ou não ou pra que é que serve uma canção como essa?
Depois de ter você, poetas para quê? Os deuses, as dúvidas, pra que amendoeiras pelas ruas, pra que servem as ruas? Depois de ter você..."

Adriana Calcanhoto

Tabacaria


"Fiz de mim o que não soube e o que podia fazer de mim não o fiz. O dominó que vesti era errado, conheceram-me logo por quem não era e não desmenti, e perdi-me.
Quando quis tirar a máscara, estava pegada à cara."

Álvaro de Campos

segunda-feira, 11 de maio de 2009

Dizem que um amor infinito já não há...mas eu não acredito.


"Dizem que um amor infinito já não há porque não pode ser. Um amor, se divino já não há nem há nada a temer e eu não acredito...não sei como eu não acredito...e peço para ver, eu só peço para ver, ainda peço para ver.
Um amor infinito, já não há, é impossível haver. Dizem que um amor consentido já não há nem se pode entender e eu não acredito, eu não, não acredito e peço para ver, só peço para ver, ainda peço para ver...
Dizem que um amor infinito já não há, nem há tempo a perder. Um amor, um princípio já não há, nem há nada a dizer e eu não acredito, não sei como eu não acredito...
E peço para ver, eu só peço para ver e ainda peço para ver..."

Madredeus

Bethânia, incomparável...


"Eu quero ser possuída por você, pelo seu corpo, pela sua proteção, pelo seu sangue. Me ame! Eu quero que você me ame e fique eternamente me amando dentro de mim. Com sua carne e o seu amor. Eternamente, infinitamente dentro de mim me envolvendo, me decifrando, me consumindo, me revelando...
Como uma tarde dentro do elevador, no verão, voltando da praia e você me abraçou e eu te abracei... E quanto mais eu me entregava, mais nascia o meu desejo, mais sobrava só o desejo, e mais eu te queria sem palavras, sem pensamentos, a vida inteira resumida só no desejo da tua boca dizendo o meu nome, da tua mão conduzindo a minha mão, do teu corpo revelando o meu corpo, como se o mundo fosse pela primeira vez, você o meu ponto de referência nessa cidade..."

José Vicente, declamado por Bethânia

Quando o amor vacila


"Eu sei que atrás deste universo de aparências das diferenças todas, a esperança é preservada. Nas xícaras sujas de ontem o café de cada manhã é servido, mas existe uma palavra que eu não suporto ouvir e dela não me conformo. Eu acredito em tudo, mas eu quero você agora.
Eu te amo pelas tuas faltas, pelo teu corpo marcado, pelas tuas cicatrizes, pelas tuas loucuras todas, minha vida. Eu amo as tuas mãos mesmo que por causa delas eu não saiba o que fazer das minhas. Amo teu jogo triste e as tuas roupas sujas é aqui em casa que eu lavo. Eu amo a tua alegria, mesmo fora de si. Eu te amo pela tua essência e até pelo que você podia ter sido se a maré das circunstâncias não tivesse te banhado nas águas do equívoco. Eu te amo nas horas infernais e na vida sem tempo. Eu te amo pelas crianças e futuras rugas. Eu te amo pelas tuas ilusões perdidas e pelos teus sonhos inúteis. Amo teu sistema de vida e morte e te amo pelo que se repete e que nunca é igual. Eu te amo pelas tuas entradas, saídas e bandeiras, te amo desde os teus pés até o que te escapa, te amo de alma para alma e mais que as palavras ainda que seja através delas que eu me defenda quando digo que te amo mais que o silêncio dos momentos difíceis quando o próprio amor vacila"

domingo, 10 de maio de 2009

Despedida


"E no meio dessa confusão alguém partiu sem se despedir; foi triste. Se houvesse uma despedida talvez fosse mais triste, talvez tenha sido melhor assim, uma separação como às vezes acontece em um baile de carnaval, uma pessoa se perca da outra, procura-a por um instante e depois adere a qualquer cordão. É melhor para os amantes pensar que a última vez que se encontraram se amaram muito e depois apenas aconteceu que não se encontraram mais. Eles não se despediram, a vida é que os despediu, cada um para seu lado, sem glória nem humilhação. Creio que será permitido guardar uma leve tristeza, e também uma lembrança boa; que não será proibido confessar que às vezes se tem saudades; nem será odioso dizer que a separação ao mesmo tempo nos traz um inexplicável sentimento de alívio, e de sossego; e um indefinível remorso; e um recôndito despeito. E que houve momentos perfeitos que passaram, mas não se perderam, porque ficaram em nossa vida e que a lembrança deles nos faz sentir maior a nossa solidão, mas que essa solidão ficou menos infeliz.
Que importa que uma estrela já esteja morta se ela ainda brilha no fundo de nossa noite e de nosso confuso sonho? Talvez não mereçamos imaginar que haverá outros verões, se eles vierem, nós os receberemos obedientes como as cigarras e as paineiras, com flores e cantos. O inverno, te lembras, nos maltratou, não havia flores, não havia mar, e fomos sacudidos de um lado para outro como dois bonecos na mão de um titeriteiro inábil.
Ah, talvez valesse a pena dizer que houve um telefonema que não pôde haver, entretanto, é possível que não adiantasse nada. Para que explicações? Esqueçamos as pequenas coisas mortificantes, o silêncio torna tudo menos penoso.
Lembremos apenas as coisas douradas e digamos apenas a pequena palavra: adeus; a pequena palavra que se alonga como um canto de cigarra perdido numa tarde de domingo."

Rubem Braga

Tempo, tempo, tempo, tempo...



"Talvez pudesse o tempo parar quando tudo em nós se precipita, quando a vida nos desgarra os sentidos e não espera. Ai quem dera houvesse um canto para se ficar longe da guerra feroz que nos domina, se o amor fosse como um lugar a salvo, sem medos, sem fragilidade.
Tão bom pudesse o tempo parar e voltar-se a preencher o vazio.
É tão duro aprender que na vida nada se repete, nada se promete e é tudo tão fugaz e tão breve.
Tão bom pudesse o tempo parar e encharcar-me de azul e de longe, acalmar a raiva aflita da vertigem, sentir o teu braço e poder ficar.
E é tudo tão fugaz e tão breve como os reflexos da lua no rio.
Tudo aquilo que se agarra e já fugiu, é tudo tão fugaz e tão breve."

Mafalda Veiga

Saudade...


"Saudade é um pouco como fome. Só passa quando se come a presença. Mas à vezes a saudade é tao profunda que a presença é pouco: quer-se absorver a outra pessoa toda. Essa vontade de um ser o outro para uma unificação inteira é um dos sentimentos mais urgentes que se tem na vida."

Clarice Lispector

Lugar nenhum.


"A nenhum outro lugar pertenço, a nenhum outro braço, a nenhum outro corpo. Estranharia todas as mãos que não as tuas, mesmo que em outras só te buscasse. Esculpi um de mim pelos contornos que me deste e meus limites, minhas divisas, agora são todos com o teu território. Seria um estrangeiro em mim mesmo se não pudesse fazer pra sempre do teu corpo o meu último refúgio e já não saberia andar para trás e refazer os dias sem a tua trilha, sem as estrelas que me puseste nos olhos, num outro tempo que não o tempo que fizemos nosso, tão maior, onde cabem nossos momentos esquecidos e as memórias do que ainda seremos."

Ticcia

Demais ou de menos...


"Não sei sentir, não sei ser humano, não sei conviver de dentro da minha alma triste, com os homens meus irmãos na terra.Não sei ser útil, mesmo sentindo ser prático, quotidiano, nítido.Vi todas as coisas e maravilhei-me de tudo, mas tudo ou sobrou ou foi pouco, não sei qual e eu sofri.Eu vivi todas as emoções, todos os pensamentos, todos os gestos, e fiquei tão triste, como se tivesse querido vivê-los e não conseguisse.Amei e odiei como toda a gente. Mas se para toda a gente isso foi normal e intuitivo, para mim sempre foi a exceção, o choque, a válvula, o espasmo...Não sei se a vida é pouco ou demais para mim, não sei se sinto demais ou de menos...Seja como for, a vida de tão interessante que é a todos os momentos, a vida chega a doer, a enjoar, a cortar, a roçar, a ranger, a dar vontade de dar pulos, de ficar no chão, de sair para fora de todas as casas, de todas as lógicas, de todas as sacadas e ir ser selvagem, entre árvores e esquecimentos."

Álvaro de Campos

Viajar é preciso, viver não é preciso.


"Um homem precisa viajar. Por sua conta, não por meio de histórias, imagens, livros ou TV. Precisa viajar por si, com seus olhos e pés, para entender o que é seu. Para um dia plantar as suas próprias árvores e dar-lhes valor. Conhecer o frio para desfrutar o calor. E o oposto. Sentir a distância e o desabrigo para estar bem sob o próprio teto. Um homem precisa viajar para lugares que não conhece para quebrar essa arrogância que nos faz ver o mundo como o imaginamos, e não simplesmente como é ou pode ser. Que nos faz professores e doutores do que não vimos, quando deveríamos ser alunos, e simplesmente ir ver."

não sei...


" É curioso como não sei dizer quem sou. Quer dizer, sei-o bem, mas não posso dizer. Sobretudo tenho medo de dizer porque no momento em que tento falar não só não exprimo o que sinto como o que sinto se transforma lentamente no que eu digo."

Clarice Lispector

segunda-feira, 4 de maio de 2009

A Vida é uma Viagem.


Quando eu era pequeno costumava perguntar aos adultos qual era o melhor lugar do mundo. Ao conhecer uma pessoa que tinha viajado para longe, grudava nela até saber como era aquele local distante e diferente. Ficava imaginando se seria melhor morar lá do que aqui. Até que tive a oportunidade de realizar esse forte desejo e visitei muitos países. A muitos desses lugares eu voltaria, pois ainda sinto aquela curiosidade inquieta da infância, que me leva a continuar perguntando: "Afinal, qual é o melhor lugar do mundo?". Quando me percebo pensando nisso, lembro-me de uma professora. Ele lecionava geografia e um dia, percebendo meu interesse, convidou- me a conhecer sua coleção de cartões-postais. Abriu um baú e deixou sair milhares de cartões que recebia de todas as partes do mundo. E foi nesse dia que ele me disse: "O melhor lugar do mundo é aquele que você pode ajudar a ficar ainda melhor". A professora não sabia, mas estava me dando a chance de pensar, muito tempo depois, que a missão de cada pessoa é deixar este mundo melhor e, com isso, transformar-se em uma pessoa melhor. Encontrar o melhor lugar para viver, ganhar a vida, criar filhos, evoluir, ser feliz, tem a ver com essa missão. Se você diz que vai morar em tal cidade, em busca de uma oportunidade de carreira, na verdade está falando da oportunidade de colaborar com esse lugar. O melhor lugar do mundo é onde você pode usar seu talento, ter seu esforço reconhecido. Eu conheço pessoas felizes e realizadas em todos os lugares, que, aliás, são os mesmos locais em que eu também encontrei pessoas amarguradas. Isso me faz pensar que, antes de encontrar o melhor lugar do mundo, você deve encontrar-se a si mesmo. Ou sempre estará no lugar errado.